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Coisas (des)Interessantes

Coisas (des)Interessantes

06
Fev19

A continuação da saga de ser uma advogada estagiária

mudadelinha

Ando nesta vida há um ano e um mês, e confesso-vos, que depois de muitos desabafos, a coisa não melhorou, bem pelo contrário e acreditem que a necessidade de exteriorizar estes últimos meses é muita, caso contrário não o faria, porque tenho todo um exame para preparar e organizar e muitas outras coisas por fazer, porque a vida anda atarefada.

Não sei se já o disse por aqui, mas quando decidi ingressar no curso de direito, a minha verdadeira paixão era direito internacional, e continua a ser, e quando escolhi direito fui muito influenciada pelos meus pais. Não que não o quisesse, bem pelo contrário, mas se não os tivesse ouvido, certamente andaria por aí à procura de emprego com uma licenciatura em história ou em educação, qualquer coisa parecida, porque o meu sonho sempre foi ser professora. De maneira alguma não me arrependo da decisão, ainda hoje a minha mãe fala disso, e apesar de todas as dificuldades que me apareceram em direito, nunca equacionei mudar de curso, nem nunca me senti arrependida de lá estar. Senti-me cansada, frustrada, desmotivada, mas arrependida nunca. A ideia de direito internacional foi desaparecendo ao longo dos anos a estudar direito, não por não ter gostado, mas pelo grau de dificuldade e, mais tarde, a ideia de fazer os exames para o CEJ (Centro de Estudos Judiciários) também, porque essa sempre foi a segunda opção. Senti-me tão cansada no fim da licenciatura e do mestrado, que foi impensável estudar arduamente mais não-sei-quantos meses para um exame dificílimo, em que a probabilidade de ser admitida era minúscula. Eu até sou pessoa que gosto de arriscar e sei que com muito esforço, estudo e dedicação, muito foco, se consegue tudo aquilo que queremos, mas quando a vontade não é muito, é melhor nem tentar, porque é tempo e dinheiro gasto, e é melhor admitirmos isso imediatamente.

       Quando dei por terminada a licenciatura, parei uns tempos para pensar e refletir, e decidi afastar-me substancialmente das minhas ideias iniciais. Ser advogada não é um sonho, nunca o foi, mas é uma profissão onde me imagino, ou imaginava pelo menos. Tive seis meses a ponderar esta hipótese, e mais outras quantas, como se me inscrevia no centro regional do Porto ou no Pólo de Guimarães, se optava pelo horário de pós-laboral, que pessoalmente, sempre gostei mais, e muitas outras questões. Fui muito influenciada, e quando digo muito foi muito mesmo. Tomei todas estas decisões baseada em conselhos, ora dos meus pais, ora da minha antiga patrona e respetiva estagiária, e nunca ouvi o meu coração. Quer dizer, ouvir eu ouvi, só nunca lhe prestei a devida atenção. E tomar decisões baseada nos conselhos dos outros, porque me achava inexperiente, foi a morte do artista e eu nunca tive muito jeito para ser artista.

O meu estágio em advocacia começou mal, com a minha primeira patrona, e não me quero alongar muito neste primeiro tópico, porque foram tempos maus, que às vezes ainda me sobressaltam com uns pesadelos de vez em quando, tal foi a importância que dei ao assunto. Mudei de escritório, e mudei para melhor, nalgumas coisas, para piores noutras. Quer dizer, para pior acho que nunca posso dizer que mudei, porque pior que aquilo era impossível. Digamos que não fui para muito melhor.

Não vou poupar palavras, nem vou esconder, que em direito e em advocacia a média é das coisas mais importantes para o nosso currículo. A média e as línguas, e não é só no mundo do direito, em quase todos os cursos superiores e no mercado de trabalho em geral. É pelo menos a minha opinião. Quando não tens uma média simpática, que é o meu caso, ou tens outros pontos do currículo a teu favor, para conseguires um estágio/emprego razoável, numa empresa ou numa sociedade de advogados, ou vais ter de te sujeitar aos estágios medíocres de advocacia que há por aí, que é o que mais há, e lutar muito por um estágio/emprego equilibrado. E as condições que esses estágios apresentam ainda são mais medíocres que o próprio estágio.

A grande maioria dos estágios não são remunerados, não se ganha nada, se não tivermos nós de pagar para nos deixarem estagiar. E digo-vos, quando saíamos da licenciatura em direito, não estamos preparados para estagiar ao mais alto nível, ou para sermos completamente autónomos e independentes, porque na prática tudo é diferente da teórica, e se na faculdade não fazemos nada sem o apoio da legislação, na prática não precisamos da legislação para quase nada. Aliás, estou a fazer todo um estágio de 18 meses que só pego na legislação para a atualizar, e conto pelos dedos quantas vezes precisei dela para resolver alguma coisa.

É muito desmotivante começarmos numa profissão em que não recebemos nenhuma retribuição, nem nenhuma ajuda para transportes, alimentação, fotocopias, e todas as nossas despesas. É suposto andarmos até ao fim a pedir dinheiro aos nossos pais, como se eles já não nos tivessem pago toda uma licenciatura, na esperança que fossemos gente? É desmotivante, acreditem que é. No meu caso, tento compensar com trabalhos ao fim-de-semana, e até à semana, sempre que posso. Trabalhar nunca fez mal a ninguém, e não tenho medo de trabalhar seja no que for. A mim não me incomoda fazer umas horas no café e ter de sujar as mãos a lavar loiça, ou a varrer, ou a limpar casas de banho. É a única forma que tenho de ajudar os meus pais e de me ajudar a mim, é a trabalhar, e dá muita bagagem para trabalhar com pessoas e conhecer um pouco que seja o mundo de trabalho.

Mas, o mais revoltante, foi o que já disse, mais medíocres são os estágios que nos oferecem, e aqui podia falar por muitos colegas meus, mas falo pela minha experiência. No primeiro escritório, onde estive seis meses, nada aprendi porque nada fiz. O que eu fazia no escritório era estudar para os trabalhos e exames do mestrado. E podem ficar a pensar que a culpa é minha, é completamente legitimo que assim pensem, que fosse falta de vontade de aprender e de trabalhar, mas quando não nos dão trabalho, é preferível estudar do que ficarmos a olhar para as paredes, como muitas vezes me aconteceu. E odeio tempo perdido no Facebook e na internet, digo muitas vezes que tempo é dinheiro, e é uma grande verdade. Os tempos nesse escritório foram horríveis e pesados, o escritório era gelado, cheguei a ficar mesmo doente, e quando mudei, o ambiente e a minha disposição melhoraram.

A verdade é que aceitam estagiários e não têm condições para isso, nem trabalho para lhes oferecer, e muito menos vontade de os ensinar devidamente, e isso é muito mau, porque afinal o que estamos lá a fazer? Ninguém nasce ensinado lamento, todos começaram da mesma forma e alguém teve de os ensinar. Faltam 2 meses para acabar o meu estágio, e quando penso no que aprendi até aqui, desanimo. Quando penso que em Maio posso vir a ter a minha entrevista (entrevista sobre o estágio), e em junho o meu exame final, fico em choque, porque não me sinto preparada. E sabem o pior de tudo? O pior de tudo, para mim, é estarmos dependentes de outra pessoa para concluir o estágio e sermos admitidos ao exame. Digo isto inúmeras vezes, o exame é responsabilidade minha, sou eu que tenho de estudar e sou eu que vou lá estar com a caneta na mão com os meus conhecimentos, o estágio não, estou dependente da vontade alheia, e não tem sido muito agradável estar à espera que os outros me ensinem e me deixem fazer. É muito ingrato, porque ser advogado passa muito por lidar com os problemas dos clientes, e eu compreendo que transferir isso para as mãos de um estagiário sem experiência é perigoso, mas com apoio e acompanhamento tudo se faz, para isso é que estamos lá. Mas digo-vos que, num ano e meio que cá estou, nunca assisti a uma reunião e pouco ou nada falei com algum cliente.

Se nos primeiros meses até acordava bem-disposta para ir para o escritório, hoje já não acontece. Estou muito cansada do escritório, do ambiente, da porcaria do lugar e cadeira de estagiária que me dá cabo das costas e me estraga sempre as meias de vidro (se as levar, que já nem as levo!), de ter de dividir um lugarzinho na secretária do meu patrono, porque nem têm uma secretária, ou um lugar como deve ser. Estou muito cansada dos pormenores e das continhas de tudo: dos clipes, das folhas, do carimbo, se as impressões são a cores ou a preto, do café, de tudo! E, chega ao fim, e somos sempre os mocinhos dos recados, dos arquivos, das fotocópias, do café, das cartas de pagamento dos condomínios, que não nos servem de rigorosamente nada, da pesquisa de jurisprudência e afins.

E o acompanhamento devido que nos deviam dar para sermos capazes de terminar descansados isto, esse nem está previsto no nosso regulamento, é completamente aldrabado, e sabem porquê?  Porque quem paga somos nós, e não é pouco acreditem, se tivermos de prorrogar o estágio pagamos, se reprovarmos pagamos, e pagamos desde o inicio e a responsabilidade é sempre nossa quando estamos dependentes de outros

 

É desmotivante, na maior parte dos dias penso que já faltou mais, que está quase, mas depois paro e penso: e em setembro? O que vou fazer da minha vida? Para onde vou? Vou trabalhar sozinha, abro o meu escritório? Ainda sou uma menina, que não aprendeu nada durante o estágio, como é que vou trabalhar sozinha? Isto ainda mais assustador, tento manter a calma e pensar só nas férias em setembro, se as tiver. A partir de setembro a minha vida está em branco, não consigo ver absolutamente nada a partir dali, e é muito assustador não conseguimos ver o nosso futuro.

 

Tento depositar as minhas energias nos trabalhinhos que vou arranjando, que é o que me vai salvando, e penso que é um dia de cada vez e que não me vale de nada ter pressa, porque no fim tudo se compõe e tudo fica bem. Nem sempre é fácil admito, mas é isto.

 

 

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