Superar a perda de uma pessoa querida
Este post já está para ser escrito há muito tempo, mas nunca me senti preparada para tal, e achei a data justa, porque hoje faz um ano que perdi a minha pessoa, a pessoa mais importante da minha vida, a pessoa que mais me apoiou, a pessoa mais presente, a pessoa que nunca me falhou, a pessoa mais tudo: o meu avô Francisco. E a falta que ele faz, não só a mim, mas a toda a família, é inimaginável. Eu acho que a vida segue em frente, o tempo ajuda, mas as saudades nunca se vão, nunca desaparecem.
Queria poder dizer-lhe muita coisa, o meu avô foi e é das pessoas mais importantes da minha vida. Nos momentos bons é dele que me lembro, e como queria poder contar-lhe que arrendei o meu espacinho com o L., e nos maus também é dele que me lembro, porque faz-me tanta falta aquele abraço apertado, e como queria poder contar-lhe que fui despedida, e ouvir o conselho dele.
Os primeiros tempos foram muito difíceis, e a minha mudança para o Algarve ajudou-me muito, porque pude fazer o meu luto sozinha, sem pressões sociais, de que tinha de ir a casa dele, mexer nas coisas dele, e que tinha de ir às finanças ou aqui e acolá, porque tínhamos de resolver a habilitação de herdeiros, e porque havia mil e uma coisas para tratar, que me faziam lembrar todos os dias e todas as horas, de que a partir daquele dia faltava alguém.
Passou um ano, e continua a faltar alguém. E vai sempre faltar, e o lugar na mesa vai estar lá. E deixamos o cinzeiro e os cigarros onde os deixou, nunca lhes mexemos. Ainda está lá metade do cigarro que fumou no último dia, antes de o levarmos para o hospital.
Estava a trabalhar quando o levaram para o hospital, e lembro-me de ir ao hospital vê-lo, fui todos os dias, mas no primeiro dia, entrei sozinha e fiquei paralisada, senti o meu corpo a gelar. Liguei ao L. e disse-lhe que não queria, por tudo, lembrar-me do meu avô assim, não queria que a última imagem do meu avô fosse aquela. E o L. dizia-me que a imagem que eu ia guardar do meu avô nunca seria aquela. E não, não é aquela imagem que guardo, nem é de todo a quero guardar.
Aliás, o que me tem salvo, e é muito por isto que escrevo sobre este tema, são os bons momentos, são todas as memórias e recordações, de uma infância, uma adolescência e de uma vida feliz, com aquela mão ao meu lado, sempre para me amparar e para me dar a melhor palavra.
São todas as fotografias que lhe tirei, a dar comida às gaivotas e aos gatos, a molhar os pés no mar, e a vender uma cervejinha na adega que tinha e que tanto adorava. As fotografias que tenho dos seus eternos abraços. E, apesar da dor, aconchega-me a alma poder olhar para ele e ouvi-lo sempre que quero, sempre que preciso do calor dele, ou sempre que o imagino a falar comigo.
Vivam todos esses momentos, aqueles momentos que não se pagam, mas filmem muitos momentos em família, ninguém pensa nisso, nunca estamos preparados para momentos assim, para perder as pessoas que amamos, mas filmem muito, ouvir a voz das pessoas faz muita falta, vê-las sorrir também, e sentir o abraço delas, esse nunca mais é possível, mas ajuda as fotografias e os vídeos, onde ouvimos a voz e as gargalhadas juntos.
Passei e passo por fases. Muitos dias maus, alguns dias bons, tenho sobrevivido, melhor até do que alguma vez pensei. Os primeiros meses custaram muito. Há dias que o imagino a falar comigo, há dias que choro porque queria ir almoçar a casa dele. Há dias que tudo me faz lembrar dele, quase todos os dias, e há dias que me lembro que ele só queria que fossemos felizes, e que nos quer ver lutar pelos nossos sonhos e ser felizes.
Ajuda-me não ter de lidar todos os dias com esta falta, não ter de ir todos os dias a casa deles, e de fazer as coisas que normalmente fazia com ele. Alivia-me. Ando melhor quando ando distraída, atarefada com o dia-a-dia, preocupada com as mil e uma coisas que tenho para fazer.
Todos os dias me lembro, todos, mas foco-me no bom, tento ouvi-lo sempre como se nunca nos tivesse deixado.
Queria deixar uma palavra de esperança, de que quem parte não nos deixa sós, e é difícil, é muito difícil superarmos a perda, é mesmo, mas há vários caminhos. Temos de acreditar que vamos conseguir, que vamos encontrar o melhor caminho e a melhor forma de fazermos o nosso luto, e que esse pode demorar dias, meses ou anos, e que não há problema nenhum com isso, nenhum mesmo. Cada pessoa tem a sua maneira de encarar e de lidar com as coisas, principalmente com uma perda. A falta do meu avô afetou-nos de maneira diferente e cada encarou de forma diferente. Eu precisei ir com calma. Lembro-me de na semana seguinte, a minha mãe querer que eu fosse ao hospital, fazer qualquer coisa que não me recordo, e eu não consegui. Não consegui porque era demasiado cedo para mim fazer aquela trajetória e aquele percurso, que tanto me marcou. E, lembro-me, de termos de ir a casa dele, procurar por documentos e outras coisas, e eu mal entrei, saí, porque simplesmente não consegui. Ainda hoje me custa ter de ir lá fazer o que quer que seja, porque sim, porque me custa, porque me lembro, e apesar de me querer manter sempre perto, quero encontrar essa liberdade e esse à vontade devagarinho, como se o luto que vou fazendo tivesse vários degraus, várias portas, várias entradas e saídas, que aos bocadinhos vou conseguindo ultrapassar.