Com toda esta situação que vivemos nos últimos meses, vi-me obrigada a voltar a casa, a casa dos meus pais, à minha família, ao meu namorado e amigos. E se não foi muito difícil para mim desapegar-me da primeira vez, creio que desta vez me vai custar mais. Voltei a casa por muitas razões, mas principalmente porque a possibilidade ficar sozinha tanto tempo me assustou, e porque é sempre bom o aconchego de casa e dos meus.
Estes últimos meses dediquei-me a muita coisa, estudei, trabalhei, aprendi inglês, fiz exercício, cozinhei, vi séries e filmes, mas passei tempo de qualidade com a minha família e com o L. Dediquei-me a coisas que de outro modo não teria tempo para o fazer, e o bem que isso me fez é inexplicável.
Ao fim de quase três meses em casa, tenho de voltar à casa a que me chamo de lar, a minha casa, onde estão todos os meus pertences e todas as minhas coisas, onde já fiz amigos, e aonde já me afeiçoei e onde já aprendi a viver sozinha. E aprecio mesmo muito morar sozinha, já o queria há muito tempo, e já nem sequer entendo que seja uma experiência, porque as experiências são temporárias, e não quero que esta passagem seja temporária. Porque viver sozinha e longe de tudo e de todos ensinou-me muito mais do que alguma vez pensei aprender, e muito mais do que alguma vez conseguirei explicar por palavras.
Nestes momentos mais sensíveis e mais nostálgicos, do ter de ir para longe e sozinha, em que as saudades começam a apertar, descubro que sou forte, e que sou capaz de correr atrás dos meus sonhos e dos meus objetivos, e que tenho as melhores pessoas ao meu lado. Os meus pais e a minha irmã que me apoiam em tudo e nunca me deixam desistir, que têm sempre um abraço à minha espera, e que me abrem a porta quantas vezes forem precisas, e o L. que tem sempre a melhor palavra, no momento certo, que me chama à razão vezes e vezes sem conta, que não se cansa de me ouvir e tem toda a paciência, e às vezes repito a mesma coisa um milhão de vezes. E é muito por eles, não só por mim, que vou, que luto e que aguento o que for preciso, porque foi sempre isso que aprendi, que é possível, não é a sorte que comanda, é o trabalho, a vontade, a persistência e a dedicação.
E as pessoas que nos amam tornam tudo muito mais simples, porque estão ali, à distância de uma chamada e de uma mensagem. Isso não se paga, é amor, e o amor não se conta e muito menos se paga.
A altura em que esta oportunidade apareceu foi das mais complicadas da minha vida, o meu grande pilar e o meu refúgio estava doente, passamos todos um mau bocado, mas senti-me realmente a desfalecer por não poder fazer nada pela pessoa que mais me amou na sua vida, e nessa altura, a possibilidade de embarcar numa aventura para tão longe caiu como uma bomba em minha casa, mas nunca ninguém me disse que não, que não devia, ou que não queriam que fosse. Acho que a certa altura, derivado daquele momento, pensaram que eu fosse voltar atrás na minha vontade e na minha decisão, e lembro-me de uma conversa com o meu pai e de ele me dizer que eu tinha de pensar na minha vida e era eu que tinha de o fazer, porque ninguém o faria por mim. Concordei com ele, e é a verdade, ainda hoje sei que é verdade, é dura e custa, mas é o que é. Foi sempre com aquelas palavras na minha mente que eu soube que estava no caminho certo, e que estava a fazer aquilo que o meu coração me dizia para eu fazer.
Hoje, a dias de ter de regressar, custa-me deixá-los e não saber quando posso voltar, porque os dias de hoje não me permitem vir todos os fins de semana, como vinha há uns meses. Talvez esteja algumas semanas sem os ver, e vai-me custar, de certeza que vai, e vou chorar algumas vezes (muitas de certeza!), mas o longe faz-se perto de forma muito fácil, e a decisão foi e continua a ser minha, e sei que terei sempre uma porta aberta, apesar das nossas discussões e dos nossos conflitos diários, não temos de nos dar sempre bem, também aprendi isso. Há dias felizes e há dias menos felizes, que chocamos mais, não deixamos de gostar uns dos outros.
Estes meses de quarentena juntos com os meses que vivi sozinha ensinaram-me muito, e levo essa aprendizagem e ensinamento para a vida, foram tempos que não esqueceremos absolutamente!
Em tempos de quarentena e isolamento como o que vivemos, as saudades aguçam-se é verdade, mas nunca pensei que fosse capaz de ficar tantos dias em casa, longe de tudo e de todos, e estar a gostar.
Estar longe de casa tem muitas coisas boas, outras más. Há dias muito bons e há dias que nem tanto. A experiência tem sido positiva de uma maneira geral. Adaptei-me bem ao local de trabalho, mas também tenho dias que ainda me sinto perdida, porque falta-me aquela sensação de “casa”. Mas, acho que essa sensação de “estarmos em casa” demora o seu tempo, certo? Não me preocupo muito com isso. É a nossa capacidade de nos adaptarmos a novos sítios, a casas novas, a espaços novos e de fazer deles nossos.
As saudades não são tanto de chegar a casa e ter tudo feito, ou de ter alguém que o faça por mim, bem pelo contrário. Essas são as tarefas que mais me dão gosto. Cozinhar aquilo que gosto, comer o que me apetece, fazer listas daquilo que tenho e daquilo que preciso, ver panfletos dos hipermercados e ver as promoções e onde me compensa mais comprar o quê.
Dou por mim preocupada que tenho de passar a ferro, e tenho de pôr a roupa a lavar ou a secar, caso contrário não tenho calças para vestir. Dou por mim preocupada que tenho de limpar a casa, o chão é claro e parece que está sempre sujo, que tenho de ir levar o lixo para não ficar cheiros, visto que moro num T1, que tem janelas pequenas, mas que tenho de as abrir para a casa receber luz e respirar.
Tenho saudades da companhia, que se suaviza pelas novas tecnologias. Tenho saudades de chegar a casa e ter as minhas cadelas a saltar-me para as pernas, deitar-me na cama e elas virem para a minha beira, ouvi-las pela casa durante a noite. Não posso ter animais na casa onde estou, nem quero para já. À partida, em breve irei mudar de casa, e nessa vou querer um gatinho para me fazer companhia nos dias mais só.
Tenho saudades do L., a sensação de ter um dia mau, e ter quem me confortasse, mas isso também se suaviza pelas novas tecnologias, nos dias mais tristes, tenho saudades do abraço, mas ele está sempre lá. Sempre mesmo.
Este também era um dos meus principais medos. Ficar doente e não saber o que fazer, e estar sozinha. Não tenho grandes amigos nesta zona, com exceção dos meus colegas de trabalho.
Ficar constipada nesta altura foi assustador, primeiro por causa das notícias do COVID-19, depois porque não sou daqui, nunca me dirigi aqui a um hospital ou a um centro de saúde, não tenho médico de família aqui sequer, depois porque tenho toda a minha família numa zona de “risco”, onde já existem alguns casos positivos. Não sou mesmo de alarmismos, estou mais assustada por estarem a fechar tudo, do que com o vírus propriamente dito.
Já estava adoentada há uns dias, as mudanças de temperatura devido ao ar condicionado alteram-me todo o sistema, e o clima também, que é totalmente diferente daquilo que estou habituada. Este também é um dos pontos de adaptação, porque é muito bonito estar sempre calor e sol, mas isso tem outras consequências.
Na segunda cheguei ao escritório mesmo constipada, já tinha comprado medicamentos e parecia-me que seriam alergias. Chamaram-me à atenção que devia ter ficado em casa a recompor-me, mas para mim ficar em casa por causa de uma simples constipação era demais. Mas, lá está, esqueci-me que as pessoas estão todas assustadas por causa do vírus. A meio da tarde, no fim de uma formação, lá me pareceu razoável ficar por casa e recuperar bem. Na terça, não existiam melhorias, decidi dirigir-me a algum sítio que me ajudassem, lá fui ao centro de saúde mais próximo e de lá segui para o Hospital de Faro.
No Hospital de Faro, ao fim de umas horas de espera nas urgências, concluíram que mais não seria do que alergias e uma inflamação leve na garganta. Nada de novidades, portanto. A medicação foi igual à que já estava a tomar, e recomendaram-me os cuidados normais, principalmente por ter as defesas mais frágeis.
A verdade é que fiquei 2 dias e meio sozinha em casa a recuperar e isso era o que me assustava, e não foi muito agradável. Porque, pode parecer estranho, mas companhia nestes dias sabe bem. Mas, tudo se recompôs.
Já estou bem, fiquei bem, e não sou um caso positivo de CODAVID-19, felizmente. Ao fim destes 3 dias, sinto uma pontinha de orgulho desmedida, porque já não tenho de ter medo de ficar doente e sozinha. Mais um obstáculo superado com sucesso!
Gostava de começar pelo início, mas nem sei bem como é que isto começou. Há uns dias fez um mês que estou a viver sozinha, a 500km de casa, longe da minha família, namorado e amigos. E, nada melhor que fazer um balanço do primeiro mês e pensar como é que isto começou.
Vim cá em Novembro, ainda o meu avô estava doente (aqueles momentos que nos marcam), e lembro-me de vir no comboio a pensar “E se a resposta for positiva? Largo tudo e venho? Vou ponderar, não vou ponderar?”. Vinha cheia de receios e de medos, mas vinha cheia de vontade de arriscar de mudar tudo, toda a minha vida, todo o meu dia-a-dia. E o L. vinha comigo, embarcou comigo na aventura, de vir ao Algarve umas horas, para uma entrevista, que tanto podia correr bem, como podia correr mal. Se estava preparada para tal, penso que sim.
A verdadeira aventura começou com a procura de casa! Eu sabia que não ia ser fácil, mas não pensei que fosse tão difícil. Por breves momentos, achei mesmo que seria impossível conseguir um T0/T1 por menos de 500€ e que não me pedissem os rins e os ovários de adiantamento e caução. Mais, que fosse por menos de 500€ e que fosse arrendamento anual, porque no Algarve o pão-nosso-de-cada-dia são os "arrendamentos por temporadas", ou nos meses de Verão. É tão-só ridículo.
Ao fim de umas semanas de emails, telefonemas e mensagens, lá me caiu do céu um T1, perto de Tavira, por um preço aceitável, mas que não é em Tavira, como eu queria e quero, porque Tavira é uma cidade caríssima para arrendar ou até mesmo comprar. O ramo imobiliário por estes lados está assustador.
Queria um t0/t1 para ter condições, não só para mim, mas para receber a minha família, namorado e amigos, ao invés de ter de partilhar casa e ter um quarto, apesar de ter mais companhia, isso envolve outra logística a que não estou habituada, então coloquei logo essa hipótese de lado.
Quando consegui casa, onde não me pediram balúrdios de caução ou de rendas adiantadas, lá defini um dia para me mudar e as mudanças Porto-Algarve foram outra aventura não é verdade? Estamos a falar de 500km de distância. Fiz duas viagens de comboio e de autocarro, porque podemos trazer toda a bagagem que quisermos, e a última fiz de carro, o que tornou tudo mais fácil, porque alberguei no carro toda a minha casa. Estamos a falar de roupa, calçado, coisas para a casa e livros e tralha de material de estudo. Não foi de todo fácil, mas foi possível, e foi-se fazendo à medida que fui a casa.
Uma nova etapa começou, uma fase nova da minha vida, e por estranho que seja dizer isto, mais em voz alta, estou a gostar. Estou a gostar particularmente de morar sozinha, do silêncio e da solidão, acho que sempre precisei disto. As lágrimas aproximam-se dos olhos na hora da despedida, mas voam na hora que tenho os pés em terras algarvias e sinto que esta agora é a minha vida. E está tudo à distância de um telefonema, de uma chamada via Skype ou via Facebook.
Não me tem custado estar sozinha, fazer as lides de casa, cozinhar para mim, fazer compras para mim, chegar a casa e não ter ninguém e ter a casa como a deixei. Tem sido bom!
Esta aventura continua, todos os dias há uma coisa nova para contar.
Fui atrás dos meus sonhos, a mais de 400km de casa e de tudo o que me é familiar. As palavras custam a sair, ainda pela mistura de emoções que vai aqui dentro. Decidi correr atrás dos meus sonhos, porque os meus me apoiam em tudo, o L. foi comigo numa viagem de 6h de comboio para lá e 6h para casa, na incerteza se uma simples entrevista ia correr bem ou não e a minha mãe nunca largou o telemóvel, ansiosa que a qualquer momento lhe ligasse. Numa quarta-feira ligaram-me, e na quarta-feira seguinte lá estava eu, firme daquilo que quero para a minha vida.
Saímos de Campanhã às 5.40h, para chegar ao Algarve às 12.10h. Comboio foi o melhor transporte que consegui, tendo em conta que foi marcado em cima da hora. A entrevista estava marcada para as 15h, pelo que deu tempo de darmos uma voltinha e almoçarmos descansados, sem pressas. Nunca tínhamos ido a Tavira, aliás foi a primeira vez do L. no Algarve e a minha em Tavira. Tivemos sorte com a metereologia. Saímos do Porto com chuva e frio, cheios de roupa, e chegamos ao Algarve com um sol maravilhoso e 20C, como tanto gostamos.
Estivemos quase uma hora à espera no café à frente do escritório, e aquele nervosismo irritante começou a fazer das suas. Já não me sentia nervosa para uma entrevista há muito tempo, ao fim de tantas que já fui, aquela era só mais uma, mas a muitos quilómetros longe de casa. Fui tranquila, como sempre tento ir, depois de lá estar, é só uma conversa sobre mim, nada de assustador. E a primeira pergunta não podia deixar de ser o porquê de estar disposta a tamanha mudança e a querer ir trabalhar para Tavira. A resposta é muito simples, assusta-me e sei que assusta todos à minha volta, inclusive o L., gosto de mudanças e de novas experiências, e a minha vida precisa de uma grande reviravolta. Se essa grande mudança está a 400km de casa, assim o será. São feelings que sinto, caso contrário não tinha ido.
É uma coisa que quero e que apesar de assustada, porque definitivamente ainda estou em pânico, sinto-me preparada para esta mudança e vão ter a oportunidade de a acompanhar aqui, porque tenho muita necessidade de escrever sobre isto e sobre tudo o resto que se tem passado na minha vida.
À partida só irei entre janeiro e fevereiro, e até lá preciso de tratar de muita coisa, inclusive de arranjar casa. A ideia inicial seria um quarto confortável e familiar, para pagar menos e poupar mais, mas a longo prazo iremos os dois (pelo menos a ideia é essa!), e não faz sentido estar a escolher um quarto, quando daqui a uns meses vamos precisar de T0 ou de um T1 para os dois, por isso prefiro já arrendar um apartamento ou uma casa pequenina.
Respiro fundo e sinto que é um recomeço, que há muito ansiava sabem? Quem me é próximo sabe disso, e para já só contei mesmo aos mais próximos, família e pouco mais. Estou feliz, porque finalmente vou começar a trabalhar na minha área, vou ter o meu cantinho, e estou feliz porque não vou assim para tão longe. Vou estar dentro do meu país, as pessoas têm a mesma cultura e a mesma língua, e isso é um descanso.
A aventura já começou com a procura de casa, mas fica para outra altura.