Querida quarentena,
(esta imagem foi retirada daqui)
Ou isolamento social, Covid-19, o que lhe quiserem chamar, agora que já estás de partida (espero!) tenho a dizer-te que, apesar de todos os inconvenientes e imprevistos que nos trouxeste a todos, tenho muito a agradecer-te, porque neste tempo todo em que estive isolada e “fechada” em casa, tive tempo e mais que tempo de pensar que também me trouxeste coisas boas.
A mais importante de todas, tempo, tempo a mais até, mas obrigado por isso, sabes porquê? Porque não o terei desta maneira tão cedo, nem quando estiver de férias, e vais-me ouvir queixar muitas vezes disso, e ainda me vais ver a implorar por tempos como estes, em que tive tempo de fazer tudo e mais alguma coisa, tudo aquilo que me queixo todo o ano de não ter tempo.
Tentei ser produtiva nestas semanas em que estive em casa. As primeiras semanas custou, deixei-me ser vegetal, porque senti que também o merecia, os últimos meses não tinham sido fáceis, a mudança e o trabalho no novo escritório esgotou-me e sentia-me mesmo muito cansada. Então, passei duas semanas deitada a ver Netflix, a consumir inutilidades das redes sociais e a comer porcarias.
Ao fim de duas semanas já estava cansada de não fazer nada de produtivo e então decidi pôr mãos à obra.
- Comecei por estudar e trabalhar com o material que tinha à mão. Não trouxe muita coisa comigo, mas decidi deixar de me queixar e desenrascar-me com aquilo que tinha. O meu exame de agregação aproxima-se e não vou gozar de um período como este tão cedo, em que podia dedicar-me tão bem aos estudos.
- Nesses dias, começaram também as iniciativas das conferências online, não só sobre este período e sobre esta situação excecional, mas de muitos outros assuntos que me interessavam. Então, deixei de consumir tanto redes sociais, para me dedicar mais a isso, ao conhecimento e à cultura geral.
- Tive oportunidade de aperfeiçoar o inglês, com aulas em canais de Youtube, mas com material disponível na internet, livros que tinha em casa, e ainda com uma amiga australiana que conheci recentemente, que ao contrário de mim, precisava aprender português. Decidi tirar uma hora todos os dias para isso, e que bem que me fez!
- Inscrevi-me, também, num curso online e gratuito de Cultura e Língua Chinesa, promovido pela Universidade do Porto. Já tinha tido aulas de Mandarim na faculdade, e aproveitei a dica para relembrar alguns conceitos básicos.
- Além do inglês e do mandarim, aproveitei para ouvir espanhol, com menos intensidade é verdade, mas que sirva pelo menos para me sentir mais à vontade com a língua e para interiorizar algumas coisas.
- Descobri, entretanto, um gosto que desconhecia completamente, que é desenhar. E que me permitiu descontrair das restantes tarefas mais intelectuais, com o objetivo de decorar os meus cadernos e resumos.
- O mais importante de tudo e que achei que nunca conseguiria, foi começar a praticar algum exercício físico. Há anos que não fazia nada e que me queixava que devia, porque tenho imensos problemas de coluna e de joelhos que me proporcionam dores horríveis, e que sentia que eram pela falta de dinâmica física. E é verdade, desde que comecei, sinto que melhorei imenso, e ainda consegui levar de arrasto a minha irmã e o L. Todos os dias fazemos 15/20 minutos de exercício, descobrimos aplicações e canais de Youtube, e quando queremos descansar fazemos yoga só para descontrair e alongar os músculos. O importante agora é não parar, mesmo quando voltar a rotina, quero continuar a ter este hábito.
- Pela primeira vez em cinco anos de namoro, vi quatro séries com o meu namorado, e vou ter muitas saudades disso, porque nunca temos tempo juntos para o fazer. Vimos As Telefonistas, La Casa de Papel, Vis a Vis e estamos a acabar Narcos.
- Passei tempo de qualidade com a minha família e com o meu namorado. Almocei e jantei todos os dias em casa, cozinhamos algumas coisas, fizemos panquecas várias vezes, jogamos cartas muitas vezes, umas vezes a apostar shots de Licor Beirão, outras tantas só porque gostamos.
E é isso que quero agradecer-te, porque se não fosse todo este tempo nunca teria tempo para me dedicar a alguma destas coisas. Fico com pena de não ter conseguido praticar piano, que tanto quero há tantos anos, mas acabei por não descobrir o carregador do meu teclado. Fica para outra vez.
Não vou ter saudades tuas, e espero que tudo se resolva o mais rápido possível, infelizmente foram mais os inconvenientes que trouxeste, mas vou ter saudades de tudo o que fiz, e espero conseguir torná-los hábito e não me desleixar em nenhum.