Tenho imensas memórias de infância e grande parte delas são na casa dos meus avós, quer dos meus avós maternos, quer da minha avó paterna, porque passei metade da minha infância em cada um deles. Cresci com a minha paterna até aos 8 anos e aos 8 anos passei a ir para casa dos meus avós maternos, apesar de sempre ter ido lá, não ficava lá durante a semana.
Sempre tive uma relação muito especial com o meu avô materno, somos três netos e eu sou a do meio, fui a primeira neta por aqueles lados e sempre, mas sempre, foi o meu avô que me levava e me ia buscar à escola. Esta deve ser das primeiras memórias que tenho com ele, dos carros que ele tinha e de ser ele que estava à minha espera quando saía da escola, de lhe vir a contar como tinha corrido o dia pelo caminho, os trabalhos de casa que tinha para fazer, o número novo que tinha aprendido ou a palavra que já sabia ler. Uma das melhores características do meu avô é a paciência, principalmente com crianças. Outras das suas melhores características é tratar toda a gente por igual, para ele não há netos, nem filhos preferidos, todos valem o mesmo e ninguém nota qualquer tipo de distinção ou preferência.
Claro que uma das minhas melhores memórias de infância tinha de ser com o meu avô e, às vezes, quando penso nele, esqueço-me destes dias, em que ele me ia buscar à escola ou infantário, não me lembro bem que idade que tinha, e antes de a minha mãe chegar a casa deles para me ir buscar, ele ficava comigo a fazer desenhos dos pássaros que tinha na casota e que estavam penduradas na loja que eles, ainda hoje, têm. Havia um pássaro amarelo, que era lindo aliás, era o meu preferido e ele dizia que era meu.
E que saudades dos tempos em que tinha pássaros na loja, e pegava neles para nos mostrar e para fazermos festinhas! Além disso, o meu avô desenhava mesmo muito bem, principalmente pássaros.
Não sei explicar porque é que nunca me lembrei de escrever este post antes, quando era miúda adorava contar estas histórias a meio mundo e, bem, era sempre a risota porque nunca ninguém se acreditava em mim, achavam que era completamente inconcebível, mas hoje, sexta-feira 13, tinha de partilhar alguns dos meus maiores azares em criança.
Sempre fui uma criança muito traquina, não sabia estar quieta no meu lugar, brincava com tudo e com todos e, agora que penso nisso, fui mesmo uma criança muito feliz. Os meus pais deixaram-me ser, tanto a mim com à minha irmã mais nova, muito sonhadoras e brincalhonas também. Os tempos eram outros e os meus pais nunca foram de nos dar todos os brinquedos, apesar de ter tido muitos brinquedos e muitos jogos, o que nos davam implicava sempre a nossa imaginação e isso criou em mim uma espécie de submundo, como se vivesse noutro planeta, acho sinceramente que é uma coisa que falta muito às crianças de hoje, a possibilidade de sonharem e de brincarem com o nada, ou de terem de inventar brincadeiras para se divertirem. Isso fez de mim quer uma criança muito feliz como muito sonhadora. Ao longo da minha infância sonhei ser tudo, quis ser veterinária, professora, cabeleireira, juíza, educadora de infância, quis ser tudo basicamente. Se me fizessem essa pergunta todos os dias, todos os dias teriam uma resposta diferente, porque a minha imaginação falava por mim.
Derivado dessa imaginação e dos sonhos que criava deu muitas dores de cabeça aos meus pais quando era pequena, ao contrário da minha irmã que sempre foi mais calma e mais reservada.
Quando era pequena adorava ir às compras com os meus pais. Normalmente íamos sempre ao hipermercado ao sábado de manhã e à tarde eles levavam-me ao parque. Num desses sábados que sabia que íamos às compras, e eu precisava de uma escova dos dentes nova, ou seja motivo de completa excitação para uma criança, os meus pais foram em primeiro para o carro, para o tirar da garagem. As escadas da minha primeira casa eram em forma de caracol e no fim das escadas tinha um pequeno tubo por onde passava água, por qualquer motivo que desconheço. Quando ouvi o carro a ligar pensei que os meus pais iam sem mim e que ficava em casa de castigo sozinha, então desci as escadas quase a voar, nunca mais pensei no tubo que atravessava o fim das escadas. Resultado da história, tropecei por cima do tubo e caí de cara no chão. Fiquei toda magoada, mas a minha cara ficou mesmo em mau estado. Já não fomos às compras, fomos diretos ao hospital, conclusão da história.
Logo aos 5 anos de idade, numa ida ao S. João, na nossa cidade (Vila do Conde tem um S. João maravilhoso digo já!), os meus pais deixaram-me ter um martelo com um apito. Que maravilha, eu adorava os martelos com apitos! Mas naquele dia o azar falou por mim! Sempre fui trapalhona, desde que me lembro, e ia a correr com o martelo nas mãos, um bocadinho mais à frente dos meus, quando tropecei nos meus próprios pés (quem nunca?) e enfiei o martelo dentro da minha boca, a parte do apito já agora! Não quero causar imagens perturbadoras em vocês porque a história teve um final feliz. Fui operada de urgência naquele mesmo dia e os médicos conseguirem salvar o meu céu da boca, mas fiquei com uma cicatriz gigante, que não me faz confusão nenhuma porque não se vê, nem me deixou sequelas graves na fala. Mas os meus pais apanharam o susto da vida deles, a minha mãe conta-me que naquele dia vestia um casaco muito bonito cor-de-rosa claro que ficou vermelho, ficou cheio de sangue. A história agora tem piada, na altura não teve logicamente.
Uns anos mais à frente, tinha eu os meus 8/9 anos, não me lembro precisamente, no magusto, andava a brincar com os meus amigos e na altura faziam-se fogueiras nos recreios da escola (não sei se ainda se faz, mas creio que não!) e no meio da brincadeira entrou-me uma faúlha para dentro de um olho. No momento não dei conta do sucedido, mas passado umas horas quando cheguei a cara, o meu olho estava assustador. A minha mãe quando chegou a casa levou-me logo ao hospital e tinha queimado não-sei-o-quê do olho, mas nada grave porque conseguiram retirar a tempo. Não sei se foi desde essa altura, mas passado uns tempinhos comecei a ver mesmo muito mal, uso óculos desde os 10 anos. Os médicos disseram à minha mãe que foi uma sorte não ter ficado cega daquele olho. Mais um susto!
No meio de mais não-sei-quantas histórias que podia contar e das tantas vezes que os meus correram comigo para o hospital a mais grave foi quando parti a cabeça. Nunca parti nenhum membro do corpo, só a cabeça, grave! A casa onde moro hoje estava em construção e na primeira visita que fizemos a casa estava toda em cimento ainda, e o poço também. Na altura devia-me achar alguma animal saltitão e juntamente com a minha irmã decidi saltar um dos poços de um lado ao outro. Não correu muito bem porque não cheguei ao outro lado e fiquei pelo caminho a escorregar sangue da cabeça. Levei 13 ou 14 pontos e a minha mãe quase morria de ataque cardíaco.
Podia contar mais mil histórias porque, como disse, sempre dei algumas dores de cabeça aos meus pais, ao contrário da minha irmã. Hoje rimo-nos destas histórias, na altura não foram muito engraçadas porque até os médicos no hospital já nos conheciam.
No fim, sei que fui uma criança muito feliz, que os meus pais sempre me deixaram sonhar, antes me tivessem deixado sonhar menos, porque às vezes chegamos à conclusão que tanto eu como a minha irmã crescemos numa espécie de bolha, a leste do mundo real. Mas também acho que as crianças precisam sonhar e brincar, precisam inventar e imaginar. Acho que isso é fundamental para uma criança e tem-se perdido ao longo dos anos o que é triste.
Mais histórias de infância por aí? Acho delicioso quando se fala em brincadeiras de infância e histórias engraçadas que aconteceram a todos.