É a primeira vez que estou a morar sozinha. Até ao momento sempre morei em casa dos meus pais, não fui estudar para longe, não fui de Erasmus, sempre fui muito caseira, ou os meus pais sempre foram muito protetores e galinhas. Uma das duas, ou as duas.
Eu não estava habituada a fazer todos os dias o meu almoço e jantar, ou a fazer as tarefas diárias de uma casa, ou a ir deixar fora o lixo, ou a passar todos os dias a minha roupa a ferro e andar preocupada com isso. Estava habituada a fazer isso e muito mais, porque sempre aprendi a fazê-lo, mas não todos os dias.
Mas, isso não foi nenhum choque. Gosto de o fazer, compro aquilo que gosto, janto aquilo que quero, só me preocupo mais com o almoço, porque almoço no escritório e porque gosto de me alimentar bem durante o dia.
Os meus maiores medos aconteceram na mesma semana e não foi de todo agradável. Um foi esquecer-me do botão do fogão ligado durante o dia, por total descuido, e o outro foi encontrar bichos em casa. Não gosto de aranhas, nem de abelhas, esses bichos e bichinhos causam-me arrepios, e sempre chamei alguém para me ajudar. Sabia que a partir do momento que estivesse sozinha não teria ninguém, não podia chamar o meu pai, ou namorado, ou a minha mãe, ou irmã, ninguém. As minhas únicas soluções eram safar-me sozinha ou chamar a senhoria, que por acaso mora atrás de mim, e essa foi a minha solução para o problema do gás, porque por acaso a senhora estava em casa e apercebeu-se e conseguir agir a tempo. Por acaso, quando dei pela aranha (acho eu que era uma aranha, nem tenho a certeza!), estava a falar com os meus pais pelo Skype. Enquanto se riam e gritavam comigo que tinha de me safar, eu lá ganhei coragem para matar o bicharoco, mas antes ainda batia à porta da senhoria, mas não estava ninguém. Não sei se fiquei branca, pálida, se quase desmaiei com os nervos, valeu pelo susto, e já não há próxima, porque da próxima já não fico sem reação!
Quanto ao gás, sempre fui muito cuidadosa, principalmente depois de estar sozinha, mas aconteceu. Fez com que tivesse o dobro da atenção e o dobro do cuidado.
Entrei em pânico nas duas situações, mas tudo se resolveu e tudo ficou bem, é o mais importante! E evitar que volte a acontecer.
Gostava de começar pelo início, mas nem sei bem como é que isto começou. Há uns dias fez um mês que estou a viver sozinha, a 500km de casa, longe da minha família, namorado e amigos. E, nada melhor que fazer um balanço do primeiro mês e pensar como é que isto começou.
Vim cá em Novembro, ainda o meu avô estava doente (aqueles momentos que nos marcam), e lembro-me de vir no comboio a pensar “E se a resposta for positiva? Largo tudo e venho? Vou ponderar, não vou ponderar?”. Vinha cheia de receios e de medos, mas vinha cheia de vontade de arriscar de mudar tudo, toda a minha vida, todo o meu dia-a-dia. E o L. vinha comigo, embarcou comigo na aventura, de vir ao Algarve umas horas, para uma entrevista, que tanto podia correr bem, como podia correr mal. Se estava preparada para tal, penso que sim.
A verdadeira aventura começou com a procura de casa! Eu sabia que não ia ser fácil, mas não pensei que fosse tão difícil. Por breves momentos, achei mesmo que seria impossível conseguir um T0/T1 por menos de 500€ e que não me pedissem os rins e os ovários de adiantamento e caução. Mais, que fosse por menos de 500€ e que fosse arrendamento anual, porque no Algarve o pão-nosso-de-cada-dia são os "arrendamentos por temporadas", ou nos meses de Verão. É tão-só ridículo.
Ao fim de umas semanas de emails, telefonemas e mensagens, lá me caiu do céu um T1, perto de Tavira, por um preço aceitável, mas que não é em Tavira, como eu queria e quero, porque Tavira é uma cidade caríssima para arrendar ou até mesmo comprar. O ramo imobiliário por estes lados está assustador.
Queria um t0/t1 para ter condições, não só para mim, mas para receber a minha família, namorado e amigos, ao invés de ter de partilhar casa e ter um quarto, apesar de ter mais companhia, isso envolve outra logística a que não estou habituada, então coloquei logo essa hipótese de lado.
Quando consegui casa, onde não me pediram balúrdios de caução ou de rendas adiantadas, lá defini um dia para me mudar e as mudanças Porto-Algarve foram outra aventura não é verdade? Estamos a falar de 500km de distância. Fiz duas viagens de comboio e de autocarro, porque podemos trazer toda a bagagem que quisermos, e a última fiz de carro, o que tornou tudo mais fácil, porque alberguei no carro toda a minha casa. Estamos a falar de roupa, calçado, coisas para a casa e livros e tralha de material de estudo. Não foi de todo fácil, mas foi possível, e foi-se fazendo à medida que fui a casa.
Uma nova etapa começou, uma fase nova da minha vida, e por estranho que seja dizer isto, mais em voz alta, estou a gostar. Estou a gostar particularmente de morar sozinha, do silêncio e da solidão, acho que sempre precisei disto. As lágrimas aproximam-se dos olhos na hora da despedida, mas voam na hora que tenho os pés em terras algarvias e sinto que esta agora é a minha vida. E está tudo à distância de um telefonema, de uma chamada via Skype ou via Facebook.
Não me tem custado estar sozinha, fazer as lides de casa, cozinhar para mim, fazer compras para mim, chegar a casa e não ter ninguém e ter a casa como a deixei. Tem sido bom!
Esta aventura continua, todos os dias há uma coisa nova para contar.
Fui atrás dos meus sonhos, a mais de 400km de casa e de tudo o que me é familiar. As palavras custam a sair, ainda pela mistura de emoções que vai aqui dentro. Decidi correr atrás dos meus sonhos, porque os meus me apoiam em tudo, o L. foi comigo numa viagem de 6h de comboio para lá e 6h para casa, na incerteza se uma simples entrevista ia correr bem ou não e a minha mãe nunca largou o telemóvel, ansiosa que a qualquer momento lhe ligasse. Numa quarta-feira ligaram-me, e na quarta-feira seguinte lá estava eu, firme daquilo que quero para a minha vida.
Saímos de Campanhã às 5.40h, para chegar ao Algarve às 12.10h. Comboio foi o melhor transporte que consegui, tendo em conta que foi marcado em cima da hora. A entrevista estava marcada para as 15h, pelo que deu tempo de darmos uma voltinha e almoçarmos descansados, sem pressas. Nunca tínhamos ido a Tavira, aliás foi a primeira vez do L. no Algarve e a minha em Tavira. Tivemos sorte com a metereologia. Saímos do Porto com chuva e frio, cheios de roupa, e chegamos ao Algarve com um sol maravilhoso e 20C, como tanto gostamos.
Estivemos quase uma hora à espera no café à frente do escritório, e aquele nervosismo irritante começou a fazer das suas. Já não me sentia nervosa para uma entrevista há muito tempo, ao fim de tantas que já fui, aquela era só mais uma, mas a muitos quilómetros longe de casa. Fui tranquila, como sempre tento ir, depois de lá estar, é só uma conversa sobre mim, nada de assustador. E a primeira pergunta não podia deixar de ser o porquê de estar disposta a tamanha mudança e a querer ir trabalhar para Tavira. A resposta é muito simples, assusta-me e sei que assusta todos à minha volta, inclusive o L., gosto de mudanças e de novas experiências, e a minha vida precisa de uma grande reviravolta. Se essa grande mudança está a 400km de casa, assim o será. São feelings que sinto, caso contrário não tinha ido.
É uma coisa que quero e que apesar de assustada, porque definitivamente ainda estou em pânico, sinto-me preparada para esta mudança e vão ter a oportunidade de a acompanhar aqui, porque tenho muita necessidade de escrever sobre isto e sobre tudo o resto que se tem passado na minha vida.
À partida só irei entre janeiro e fevereiro, e até lá preciso de tratar de muita coisa, inclusive de arranjar casa. A ideia inicial seria um quarto confortável e familiar, para pagar menos e poupar mais, mas a longo prazo iremos os dois (pelo menos a ideia é essa!), e não faz sentido estar a escolher um quarto, quando daqui a uns meses vamos precisar de T0 ou de um T1 para os dois, por isso prefiro já arrendar um apartamento ou uma casa pequenina.
Respiro fundo e sinto que é um recomeço, que há muito ansiava sabem? Quem me é próximo sabe disso, e para já só contei mesmo aos mais próximos, família e pouco mais. Estou feliz, porque finalmente vou começar a trabalhar na minha área, vou ter o meu cantinho, e estou feliz porque não vou assim para tão longe. Vou estar dentro do meu país, as pessoas têm a mesma cultura e a mesma língua, e isso é um descanso.
A aventura já começou com a procura de casa, mas fica para outra altura.